Afinal, o que são buracos negros?
Ao contrário do que diz a cultura popular, os buracos negros não são corpos que vagam pelo espaço aspirando todos os objetos que atravessam o seu caminho. Este cenário, muito improvável, só ocorre quando objetos chegam perto o bastante do buraco negro e atravessam o horizonte de eventos, região a partir da qual nem a luz é capaz de escapar. Além disso, os buracos negros obedecem às leis da gravitação da mesma forma que qualquer outro corpo que contém massa, o que torna encontros com esses objetos bastante raros.
Imagem em Raios-X do centro de Andrômeda. Os pontos amarelos são estrelas e o ponto azul central é um buraco negro supermassivo. Créditos: NASA
O quão grande eles podem ser?
Existem quatro tipos de buracos negros: primordiais, estelares, intermediários e supermassivos. Acredita-se que os buracos negros primordiais tiveram sua formação no Universo primordial, onde tínhamos a combinação de dois fatores: uma densidade de matéria muito maior do que a observada hoje e pequenas flutuações de densidade no espaço. Estas pequenas flutuações de densidade teriam acarretado o colapso gravitacional dessas regiões, permitindo a formação dos buracos negros primordiais. Embora eles nunca tenham sido observados, diversos modelos e simulações numéricas que levam em conta esses fatores prevêem a criação destes objetos.
Os buracos negros estelares são os mais comuns e como o nome sugere, têm origem estelar. Quando uma estrela de massa maior ou igual a oito vezes a massa do Sol chega aos estágios finais de sua evolução, as camadas mais externas explodem e são ejetadas no fenômeno que conhecemos por supernova, restando apenas o seu núcleo. Como o núcleo não possui mais combustível e energia para manter a fusão nuclear – processo que sustentava a estrela contra o colapso gravitacional – ele acaba por resfriar-se e torna-se cada vez mais compacto. Se houver massa o bastante para que a matéria colapse em único ponto, temos um buraco negro, caso contrário teremos uma estrela de nêutrons. Como estes provêm de estrelas de alta massa, esperamos que uma galáxia como a nossa possua milhares destes objetos.
Os buracos negros com as maiores massas (de milhões até bilhões de massas solares) são denominados supermassivos. Acredita-se que quase todas as galáxias tenham em seu centro um buraco negro supermassivo. A Via Láctea, por exemplo, hospeda Sagittarius A*, um buraco negro supermassivo de 4 milhões de massas solares.
Estrelas na região central da nossa galáxia. Analisando as trajetórias dessas estrelas, é possível inferir a posição e a massa de Sagittarius A*. Créditos: ESO.
Com massas entre a de um buraco negro estelar e de um supermassivo, os buracos negros intermediários são um caso particular. Existem poucas evidências observacionais destes objetos, e a razão para isso é que eles devem situar-se em galáxias anãs e nos halos de galáxias massivas, que atualmente são regiões que dificultam a sua detecção. Por terem massa intermediária, suspeita-se que eles tenham grande contribuição na formação dos buracos negros supermassivos. Se eles realmente existem em galáxias anãs, estas eventualmente irão entrar em processo de fusão com outras galáxias maiores. Neste cenário, o buraco negro de massa intermediária é capturado pela galáxia maior, espirala em direção ao seu centro e se funde ao buraco negro supermassivo.
Se são buracos negros, como podemos enxergá-los?
De fato, não enxergamos um buraco negro. Entretanto, existem diversos métodos indiretos que levam em conta as interações dos buracos negros com os objetos ao seu redor. O primeiro buraco negro descoberto foi Cygnus X-1 quando cientistas norte-americanos enviaram um satélite ao espaço contendo múltiplos contadores Geiger, com o objetivo de mapear fontes de Raios-X, descobrindo Cygnus X-1 como uma fonte não associada a nenhum objeto conhecido. Combinando as observações em Raios-X com observações em rádio, astrônomos conseguiram mapear sua posição no céu, estando associada à estrela HDE 226868. Porém a estrela por si só não seria capaz de emitir radiação em Raios-X na intensidade detectada, e a massa de Cygnus X-1 era certamente maior do que a massa limite para uma estrela de nêutrons. Assim, estava detectado o primeiro buraco negro. As emissões em Raios-X são causadas pelo gás no disco de acreção do buraco negro, que se aquece conforme se aproxima do horizonte de eventos.
Cygnus X-1 observado em Raios-X pelo telescópio espacial Chandra. Créditos: NASA.
Outra forma bastante popular de detecção de buracos negros é através da análise das órbitas de estrelas. Aquelas que estiverem próximas de um buraco negro apresentarão órbitas diferentes daquelas que não estão, devido à atração gravitacional. Sagittarius A*, por exemplo, têm sua posição determinada com precisão através deste método.
Com os novos observatórios de ondas gravitacionais, os cientistas são capazes de detectar pequenas distorções no espaço-tempo causada pela interação entre objetos compactos em processo de fusão. Isso não apenas favorece que mais buracos negros sejam detectados, mas permite o estudo aprofundado da física envolvida nesses processos, fundamental para entendermos como se dá a evolução destes corpos.
A primeira foto de um buraco negro
A primeira imagem em rádio de um buraco negro. Créditos: EHT collaboration.
Publicada em 10 de abril deste ano pela colaboração Event Horizon Telescope (EHT), a primeira imagem das proximidades do horizonte de eventos do buraco negro supermassivo de M87 revela detalhes em rádio nunca antes observados de um buraco negro. Capturar imagens destes objetos é uma tarefa muito difícil, pois eles concentram muita massa em regiões muito pequenas do espaço. Um buraco negro de 10 massas solares, por exemplo, teria um horizonte de eventos de raio igual a 30 km. Dessa forma, mesmo que um objeto como este estivesse tão próximo de nós quanto Alpha Centauri, nenhum telescópio sozinho seria capaz de observá-lo. Tendo isso em vista, os buracos negros supermassivos embora muito mais distantes, possuem um horizonte de eventos muito maior, o que faz com que sejam bons alvos para uma observação direta. A colaboração EHT fez o uso de técnicas de interferometria para combinar observações simultâneas de diversos radiotelescópios, de forma que as observações eram equivalentes a de um radiotelescópio do tamanho da Terra.
A imagem levou estudos sobre buracos negros para um outro nível. Até então só era possível estudá-los através do seu disco de acresção e do movimento das estrelas ao seu redor. Na imagem, o horizonte de eventos corresponde a região aproximadamente 2 vezes menor do que a sombra visível. O fato de o gás “abaixo” do buraco negro ser mais brilhante é uma evidência de que nesta região o gás se move na nossa direção. Ainda, a massa estimada deste buraco negro supermassivo é de 6.5 bilhões de massas solares. Esta imagem não apenas ampliou o estudo de buracos negros para a região do horizonte de eventos, mas permitiu uma série de testes da Teoria da Relatividade Geral. E a busca por mais detalhes destes objetos fascinantes não para por aí. A inclusão de novos telescópios para observar buracos negros em diferentes comprimentos de onda e a criação de novos algoritmos para processar os dados destas observações é iminente. Em breve, poderemos estar observando uma nova imagem de algum outro buraco negro em ainda mais detalhes.